Você já deve saber que a diversidade é importante, mas será que ela está sendo realmente vivida no dia a dia da sua empresa? Hoje, a diversidade no ambiente de trabalho vai muito além de uma boa prática: ela se tornou um fator essencial para o desempenho, a inovação e a competitividade das organizações.

Falando em números, empresas com lideranças diversas têm 21% mais chances de registrar lucros acima da média (McKinsey); ambientes com senso de pertencimento claro entregam até 56% mais performance (Harvard Business School) e times diversos têm 152% mais chances de entender melhor o cliente (Harvard Business Review).

Apesar disso, a realidade brasileira ainda escancara exclusões: 7 em cada 10 pessoas com deficiência estão fora do mercado de trabalho (IBGE, 2019) e 34% dos profissionais com deficiência se sentem isolados no trabalho (Catho, 2023).

Para transformar a diversidade em algo vivo e real, é essencial entender que ela não é uma pauta única, é um universo complexo de vivências que se cruzam. E é aí que entra a interseccionalidade. Continue lendo!

Interseccionalidade e diversidade no ambiente de trabalho

diversidade no ambiente de trabalho
A diversidade no ambiente de trabalho depende da interseccionalidade

Em 1968, Emma DeGraffenreid, uma mulher negra nos Estados Unidos, moveu um processo por discriminação contra uma empresa de automóveis que se recusava a contratá-la. A justiça, no entanto, não reconheceu o caso como discriminação, pois a empresa já contratava mulheres brancas e homens negros. 

O que a corte ignorou, e que hoje temos mais clareza, é que o preconceito enfrentado por Emma estava justamente na intersecção entre gênero e raça. Essa história ajuda a entender por que precisamos olhar para a interseccionalidade no ambiente corporativo com mais atenção e sensibilidade.

Interseccionalidade é o nome dado à sobreposição de diferentes identidades sociais (como raça, gênero, classe, deficiência, orientação sexual, entre outras) e como elas podem impactar, em conjunto, a experiência de uma pessoa no trabalho. Criado pela professora Kimberlé Crenshaw, o conceito mostra que nenhuma identidade atua de forma isolada e que, para promover uma inclusão real, precisamos enxergar o todo. 

Uma mulher negra com deficiência, por exemplo, pode enfrentar barreiras muito diferentes das enfrentadas por uma mulher branca ou por um homem negro e políticas genéricas de diversidade podem não dar conta dessa complexidade.

No dia a dia do RH, esse olhar interseccional deve estar presente desde o recrutamento até o desenvolvimento de lideranças. Mais do que atender à legislação, aplicar a interseccionalidade é criar um ambiente onde todas as pessoas possam se sentir vistas, respeitadas e seguras para contribuir com autenticidade. 

E falando em diferentes vivências, não dá para esquecer que o Brasil é diverso até na geografia. É hora de olhar também para quem está fora dos grandes centros.

Diversidade geográfica no trabalho 

O Brasil é gigante em território, em cultura, em sotaques e em desigualdades também. E a verdade é que, muitas vezes, ainda agimos como se o mercado se resumisse ao eixo sul-sudeste. Só que talento não tem CEP fixo. A criatividade de um redator no interior da Bahia ou a visão estratégica de uma analista do Amapá têm o mesmo valor que qualquer talento da Faria Lima.

Contratar pessoas de diferentes regiões vai muito além de “incluir” sotaques na call do time: é trazer vivências plurais, olhares únicos e um entendimento real do Brasil que existe fora dos grandes centros urbanos. A Harvard Business Review já mostrou que 95% dos diretores acreditam que a diversidade traz novas perspectivas para as empresas. 

Imagina, então, o potencial de equipes com experiências tão distintas quanto o modo de preparo do cuscuz entre estados?

A tecnologia já mostrou que barreiras geográficas não precisam ser obstáculos. Desde a pandemia, o modelo remoto abriu caminho para que talentos de todas as partes do país ocupem posições antes centralizadas. Ainda assim, o percentual de contratações nas regiões norte e nordeste segue baixo (entre 1% e 5%, segundo dados da Michael Page). É papel do RH repensar onde está buscando talentos e quem está ficando de fora.

E se o lugar de origem já pode impactar as oportunidades, imagina quando algumas tecnologias reforçam, mesmo sem querer, esse tipo de exclusão? Vamos falar agora sobre viés algorítmico.

Viés algorítmico em processos seletivos: um obstáculo para a diversidade no ambiente de trabalho

diversidade de mulheres no trabalho
O viés algoritmo das IAs pode afetar a diversidade no ambiente de trabalho

A inteligência artificial virou praticamente uma colega de equipe do RH, presente na triagem, nos testes, nas entrevistas e até na decisão final. Mas, apesar da ajuda inegável que essas ferramentas oferecem em escala e agilidade, nem sempre o que é eficiente é justo. 

A gente precisa lembrar que o algoritmo não é neutro: ele aprende com o passado. E se esse passado for enviesado, cheio de padrões excludentes, a tecnologia só vai replicar essas distorções com cara de inovação.

Imagina um sistema que “aprende” que os melhores líderes sempre vieram da mesma faculdade ou têm o mesmo tom de voz nas entrevistas por vídeo. Parece inofensivo, mas pode significar que quem vem de outras formações ou tem um sotaque regional, por exemplo, nunca chega à fase final, mesmo sendo altamente qualificado. 

Quando a gente delega demais à máquina, sem supervisionar, perde a chance de corrigir desigualdades que se escondem nos dados.

Outro desafio é a famosa “caixa-preta”: muitos RHs usam ferramentas cujos critérios de decisão são pouco transparentes. Você sabe exatamente por que aquele currículo ficou no topo da lista? Foi uma palavra-chave, um curso, ou… o CEP? Se o time de seleção não entende os critérios, também não consegue questioná-los.

Portanto, não se trata de abandonar a IA, mas de aprender a usá-la com consciência. Ferramentas são ótimas aliadas, desde que quem esteja no comando tenha um olhar crítico e atento à diversidade. Porque, no fim das contas, não é o algoritmo que define o futuro da sua empresa: é quem programa, supervisiona e decide com base nele.

Diversidade no ambiente de trabalho e saúde mental

Toda essa pressão invisível dos obstáculos, somada à sensação de não pertencimento, afeta diretamente a saúde emocional. E esse é mais um ponto crítico que não pode ser ignorado.

Cuidar da saúde mental dos colaboradores já virou pauta prioritária para muitas empresas, mas será que todo mundo está recebendo o mesmo cuidado? Para pessoas negras, LGBTQIAPN+, com deficiência ou mães solo, o ambiente de trabalho pode representar um lugar de esforço dobrado: além da entrega profissional, existe o peso constante de microagressões, invisibilização e dúvidas sobre pertencimento.

Esse estresse extra impacta diretamente a motivação e o bem-estar. Um levantamento da Lupa mostra que quase 80% das pessoas entrevistadas já se sentiram desmotivadas no trabalho por não se sentirem pertencentes. E o número sobe ainda mais quando falamos em quem já presenciou ou sofreu discriminação, ou assédio: 80%. Isso é um alerta sério para o RH.

Portanto, muitas empresas até têm ações voltadas à diversidade, mas 62% das pessoas não se sentem em um ambiente seguro e acolhedor. E mais: mais da metade não confia nos canais de denúncia da empresa

Por isso, vale reforçar: ações de saúde mental precisam ter escuta ativa, liderança empática e espaços reais de confiança. Criar uma cultura inclusiva é cuidar da saúde emocional de todos e principalmente de quem, historicamente, sempre precisou provar o dobro para ocupar o mesmo lugar.

Indicadores de DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão)

diversidade no trabalho
Os indicadores de DEI são fundamentais para a diversidade no ambiente de trabalho. Já conhece?

E como saber se as ações da empresa estão mesmo funcionando? A resposta está nos dados. Falar que valoriza a diversidade não basta: o mundo está cobrando dados reais. Investidores, consumidores e os próprios colaboradores querem saber o que está sendo feito de fato. E é aí que entram os indicadores de DEI: ferramentas que ajudam a transformar boas intenções em ações concretas e mensuráveis.

Indicadores mais robustos olham para além da representatividade e acompanham temas como rotatividade por grupo social, tempo médio até promoção ou até taxa de adesão em programas de desenvolvimento por recorte. São esses números que revelam se todos estão tendo acesso às mesmas oportunidades dentro da empresa.

Além dos dados quantitativos, como proporção de diversidade em cargos de diferentes níveis, também vale investir em indicadores qualitativos, que escutam de verdade quem está na ponta: pesquisas de clima com perguntas sobre percepção de inclusão, sensação de pertencimento e segurança psicológica, por exemplo. 

Um Censo de Diversidade pode ser uma boa porta de entrada para essa escuta mais estruturada.

O segredo está na combinação entre o que se mede e o que se faz com essas informações. Medir é só o começo: o que transforma é o uso estratégico desses dados para ajustar rotas, priorizar ações e construir um ambiente mais justo, diverso e acolhedor. Afinal, não se melhora o que não se mede.

Mas não basta só medir: é preciso criar relações e diálogos que sustentem uma cultura inclusiva. E é aí que entra o feedback.

O papel do feedback inclusivo na diversidade no ambiente de trabalho

Feedback é uma das ferramentas mais poderosas para o crescimento profissional, mas só funciona de verdade quando é acessível a todo mundo. Em um ambiente inclusivo, como o retorno é dado (e recebido), é importante e necessário respeitar diferentes estilos de comunicação, trajetórias e vivências. Caso contrário, o que era para impulsionar pode virar um fator de exclusão.

Nem todo mundo se sente confortável com uma abordagem direta e fria. Da mesma forma, pessoas com experiências marcadas por preconceitos ou exclusão podem interpretar o feedback como um ataque, não como uma oportunidade. A chave está em adaptar a escuta e o discurso para que o retorno faça sentido para quem está ouvindo.

Construir uma cultura de feedback inclusivo é entender que há quem se expresse melhor por escrito, quem precise de tempo para processar, quem prefira conversas mais colaborativas e quem valorize um espaço seguro antes de se abrir. É o RH e a liderança treinando sua sensibilidade para acolher essa diversidade de formas sem achar que existe “um jeito certo” universal.

No fim das contas, feedback inclusivo é sobre respeito. É sobre reconhecer que as pessoas não são moldadas pela mesma régua e que, se o nosso objetivo é desenvolver talentos, precisamos criar condições para que elas floresçam, cada uma do seu jeito.